Era meu segundo dia em Lisboa, e após passar a manhã e a tarde conhecendo a cidade histórica fui à noite me embriagar na boêmia lisboense do Bairro Alto. Por coincidência, em um dos vários bares do bairro, haveria um show do Boogarins. Não deu outra, logo estava dentro de um clube que mais parecia uma caverna: estreito e comprido com paredes de pedra.

Eu tinha algumas moedas de euro no bolso, e que, após contar com certa dificuldade, cheguei à conclusão que dava para beber quatro cervejas de pressão (como é chamado o chopp em Portugal). Durante a primeira cerveja, enquanto o show não começava, fiquei apenas observando os jovens portugueses se divertindo ao som de Novos Baianos. Pois é, Portugal gosta mesmo é do violão de nylon brasileiro.

Antes do Boogarins subir ao palco, fui pegar minha segunda cerveja no bar, e perto dele fiquei por motivos estratégicos. Eis que então, minhas narinas começaram a sentir um cheiro de maconha em meio à fumaça de tabaco. Quando menos percebi, meus olhos já estavam procurando a origem da marofa.

Comecei a perguntar às pessoas perto de mim se alguém tinha maconha. Recebi uma resposta negativa várias vezes. Quando eu estava quase desistindo, vi dois cabeludos com cerveja em mãos em transe com as guitarras do Boogarins. Logo, lancei a pergunta. “Ei companheiros, vocês têm um baseado?”. Eles me olharam sem entender direito o que eu queria. “Oi? Não entendemos”. Refiz a pergunta, desta vez gesticulando com as mãos… “Vocês tem um beck? Maconha?”. “Aaaah, tu queres haxixe? Sim, nós temos!”, respondeu o cabeludo.

A felicidade tomou conta de mim. “Pô, muito obrigado! Já estava ficando desesperado.”. Como bons portugueses, foram extremamente polidos. “Imagina! Tens tabaco?”. Não, eu não tinha tabaco, mas pedi um pouco para um cara em minha frente que estava apertando um cigarro. “Pronto, tenho tabaco aqui. Precisa que eu bole?”, me ofereci para fazer o trabalho. “Não precisa não, mas se você tiver piteira seria bom”.

Comecei a perceber que não é apenas no português que os brasileiros se diferenciam dos portugueses, mas também no modo de fumar maconha. “Piteira? Lá no Brasil nós não temos muito o costume de usar piteira”. Os portugueses ficaram surpresos. “Ora pois, vocês não usam piteira?”. Respondi que não. “Lá no Brasil fumamos cigarro de maconha, sem tabaco, e usamos a ponta da seda como piteira mesmo”.  “Que estranho”, comentou o cabeludo.

O haxixe começou a ser passado entre nós três. “Como é lá no Brasil com maconha?”, perguntou o outro cabeludo. “Lá maconheiro recebe tapa no ouvido de policial se fumar em público. Se plantar então… vai é pro xilindró!”. Ficaram assustados os portugueses. “Pesado. Aqui podemos fumar tranquilamente, e podemos plantar em casa”.

Fui tomado pelo haxixe. Sentia meus pés tocando o chão, mas minha mente parecia estar na mesma frequência do som dos instrumentos que saia dos amplificadores. A terceira cerveja molhava minha garganta do mesmo jeito como a água molha a terra seca. Meu espírito estava livre.

Assim que o show acabou, andei chapado pelas ruas de Lisboa pensando em como a liberdade de se fumar maconha tranquilamente se torna um prazer. Sem problemas, sem violência, sem mortes. Portugal descobriu o Brasil com velas de cânhamo. Quando é que o Brasil vai descobrir Portugal como exemplo de política de drogas?

Por Francisco Mateus

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